terça-feira, 4 de agosto de 2009

A mente em movimento


Bebeu o chá fumegante até o final e deitou-se no sofá. Fazia frio lá fora, mas o ventilador girava num movimento hipnotizante, fazendo-a pensar em como estava sua vida agora.

Caminhou pelos pensamentos e lembranças, desfilou pelo emaranhado de recordações, patinou nas derrotas, correu pelas vitórias e percebeu que ainda havia muito a fazer.

A vida não dá tréguas, exige ações ininterruptas, não quer que paremos pra um cochilo. Ou será que quer?

Às vezes acha que pode e deve parar, já não sente mais a culpa por não estar em movimento. Gosta de estacionar um pouco, parece que ao estar parada percebe melhor o que acontece em sua vida e fica mais fácil resolver os percalços do destino.

Tanta ansiedade em abraçar o mundo foi ficando para trás com a chegada da famosa maturidade. Não tem mais o desespero da adolescência, a explícita agonia de quem tem pouco tempo para fazer muita coisa. Já sabe que não é assim. Sem calma e serenidade não avança, não caminha, acaba tropeçando na vida.

As vitórias serviram como estímulo para que continuasse, é a premiação por um movimento bem executado. O êxtase da vida. Mas as derrotas, tão choradas, sentidas, excomungadas, foram o que de mais precioso aconteceu.

Sem ser piegas e prender-se a clichês, ela percebeu que, se hoje estava mais serena, a culpa era muito mais das derrotas do que das vitórias. Cada fracasso ensinou-a a pensar onde errara obrigando-a em insistir em acertar. Cada fracasso fez com que seus passos seguintes fossem mais elaborados e elaborar leva tempo, exige calma, paciência, nada de impulsividade. Como conseqüência alcança-se o estado sublime da tranqüilidade.

Ela riu. Pensando assim parece que foi fácil, de um estalo tudo ficou sereno. E não foi nada disso. Antes de tudo chorou, reclamou, gritou, desdenhou de si mesma, da vida, de suas burrices, mas passou. É, tudo passa. Vida que segue.

As recordações trouxeram amigos distantes, que nem sabe por onde andam e a causa de seu sumiço. Perderam-se na infância, nas férias escolares, nos verões, na adolescência. Mas tem os amigos de agora, alguns permanecerão, outros sumirão também.

Sua mente é como o mar. Tem suas ressacas, varre todo o lixo, limpa as areias onde colocamos os pés, mas precisa da calmaria posterior, aquela que nos permite um mergulho sem preocupações, com a certeza de que podemos nadar para onde quisermos.

Gostou da ausência de movimento. Sentiu-se forte, como se as pás do ventilador tivessem recarregado suas baterias como numa usina eólica.

Levantou-se, encheu a xícara novamente e dessa vez sentiu o verdadeiro sabor da vida.

Silvia Mara

Um comentário:

Sheley disse...

Vim aqui dar uma de irmâ "coruja", amei esse texto...como tantos outros...te amo!

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